domingo, 9 de março de 2008

Jana e o Feitiço

Faz 3 anos que eu atendo uma jovem (hoje com 31), que chegou com sintomas da "síndrome de pânico" surgidos após separação de um casamento que durou 4 anos. Nesse pouco tempo de casada, Jana teve dois filhos (um casal) que ficaram com ela quando seu marido a deixou por uma outra mulher. Hoje ela mora em casa de sua mãe com seus filhos, um irmão e a avó; não mais se relacionou com homens, diz ter vergonha de ficar "falada" na rua em que mora, mas, depois assume que tem medo do que pode acontecer - ter relação sexual. Diz que seu sonho é arranjar um emprego e sair da casa da mãe, pois, sofre muito com as brigas constantes entre seus filhos e seu irmão, entretanto, nada faz para que isso aconteça: "Eu já deixei meu curriculum nas lojas e não me chamaram". Quando questionada sobre a quantidade de lojas e o tempo em que foram deixados os curriculum ela desconversa, muda de assunto. Porém, seu maior sonho é ver a mulher que "roubou" seu marido - utilizando a "macumba" - passar por tudo que ela passou, que ele a deixe por outra.
Fato curioso - mas não incomum - neste caso é o sincretismo religioso de Jana: que se diz católica meio praticante, já que não vai à missa todos os domingos; acompanha programas neo-pentecostais na TV e incorpora seu linguajar (Tá amarrado! Eu repreendo em nome de ...); e acredita piamente no poder da macumba, maus olhados, simpatias, horóscopos e outras manifestações daquilo que chamamos "pensamento mágico".
Um dia eu lhe perguntei: porque você pensa que a moça fez um feitiço para tomar seu marido, alcoólatra, desempregado e mulherengo, em vez de escolher algo melhor para conquistar com sua macumba?
- Sei lá doutor, vai ver é porque ela gostou dele...
- Não seria mais correto dizer que ele é que gostou dela e se deixou seduzir?
- De jeito nenhum...Mulher ele sempre arranjou, mas pra deixar a casa e demorar tanto tempo como está com essa desgraçada só sendo macumba mesmo... Feitiço existe sabia?...
Sei Jana, feitiço existe, mas, nenhum deles sai dos terreiros de macumba, nem de fadas, nem de varinhas, nem de duendes e nem de gnomos. Para além de todas essas invencionices infantis, que são muito boas para justificar nossas deficiências, o feitiço amoroso está em desejar e se fazer desejar, e isso é coisa pra gente grande.

Nenhum comentário: